Em Israel, a prontidão não é apenas um lema militar, é parte de cada respiração, de cada gesto, de cada rotina. Desde pequenos, meninos e meninas aprendem a reconhecer o som das sirenes que anunciam ataques aéreos, a buscar refúgio rapidamente, a não entrar em pânico. São crianças que sabem onde fica o abrigo mais próximo, que fazem simulados de evacuação na escola, e que escutam de seus pais: “Atenção salva vidas“. Para quem nunca viveu algo parecido, isso pode soar assustador, mas para os israelenses, essa educação para a emergência representa cuidado, responsabilidade e, acima de tudo, amor à vida.
Essa convivência constante com a possibilidade de ataque não gera apenas temor, mas cria uma geração que valoriza a serenidade diante do caos. Desde cedo, eles aprendem a reagir rápido, a estender a mão ao vizinho, a proteger os mais frágeis. É uma forma de crescer consciente de que a força não está somente em armas, mas também na capacidade de manter a calma e agir corretamente mesmo sob risco extremo. Essa mentalidade de prontidão se transforma numa espécie de “instinto coletivo” que orienta toda a sociedade israelense, que segue em frente apesar de qualquer ameaça.
O Exército como escola de vida
Outro elemento central na formação da mentalidade israelense é o serviço militar obrigatório. Em Israel, ele não se resume a treinar jovens para combater, mas é uma verdadeira escola de vida. Durante dois ou três anos, meninos e meninas aprendem a conviver, a confiar uns nos outros e a assumir responsabilidades. São treinados para liderar, para planejar, para improvisar soluções e, principalmente, para tomar decisões duras sob pressão.
Os israelenses sempre dizem que os amigos do exército são para sempre, e não é exagero. O convívio diário, as patrulhas compartilhadas, as noites frias em postos de vigilância, as conversas que aliviam o medo no meio do nada: tudo isso constrói laços profundos de irmandade. Essa rede de solidariedade criada na juventude continua ao longo de toda a vida adulta. Quando um soldado deixa o uniforme, ele carrega não apenas habilidades técnicas, mas também a certeza de que pode contar com seus irmãos e irmãs de armas em qualquer situação. É um senso de comunidade que transcende o quartel e fortalece toda a sociedade israelense.
Rapidez e iniciativa
A geografia e a realidade geopolítica de Israel não permitem hesitação. Cercado por ameaças, num território pequeno, o país desenvolveu uma cultura de ação imediata. O israelense médio prefere resolver os problemas sem burocracia, de forma direta, e se orgulha de improvisar soluções práticas mesmo diante de obstáculos gigantescos.
Essa mentalidade, tão forjada pela necessidade de sobreviver, virou também motor de inovação. O famoso rótulo de Startup Nation não surgiu por acaso: a mesma rapidez que salva vidas em situações de guerra também impulsiona ideias revolucionárias, negócios arrojados e tecnologias que impressionam o mundo. O israelense cresce acostumado a lidar com riscos e a tomar decisões rápidas, e leva isso para o empreendedorismo, para a ciência e para todos os setores.
Solidariedade que abraça todos
Mas talvez o traço mais tocante da mentalidade israelense seja a solidariedade. Em momentos de crise, o país inteiro se mobiliza para proteger os mais vulneráveis. Durante conflitos armados, famílias abrem suas casas para desconhecidos de outras regiões, coletivos organizam doações de alimentos e roupas em questão de horas, voluntários se arriscam para resgatar feridos ou levar medicamentos para zonas de risco.
Um exemplo muito marcante aconteceu no enterro da jovem Bruna Valeano, assassinada brutalmente no ataque terrorista do Hamas na festa de música eletrônica. Cerca de 10 mil pessoas compareceram ao funeral, gente que nem a conhecia pessoalmente, mas quis prestar solidariedade e dizer à família que eles não estavam sozinhos. Esse senso de comunidade se torna quase palpável nos momentos de dor coletiva.
Outro caso que ficou gravado no meu coração foi o do meu amigo Ben Shimoni, também presente na mesma festa. Quando o massacre começou, ele não pensou apenas em si. Ele pegou o carro e fez três viagens, levando pessoas desesperadas para zonas seguras. Voltou para resgatar mais gente, sem medir o perigo. Na terceira viagem, não retornou. Foi morto pelos terroristas do Hamas. Shimoni representa o espírito israelense: coragem, altruísmo, prontidão para ajudar, mesmo que isso custe a própria vida.
Esse tipo de atitude se repete em toda parte. Há quem ofereça carona a estranhos, quem acolha famílias inteiras que perderam tudo, quem organize cozinhas comunitárias para alimentar quem está fugindo de foguetes. É o conceito do arvut hadadit, a responsabilidade mútua, que rege esses gestos simples e grandiosos ao mesmo tempo.
Um espírito que inspira
Israel vive, há décadas, cercado por ameaças reais, de grupos armados a estados que negam seu direito de existir. Ainda assim, a sociedade israelense não se deixa consumir pelo ódio. A dor e o medo são transformados em coragem e em resiliência. Se de um lado existe vigilância constante e protocolos de segurança, do outro há música, festas, cultura viva, tecnologia de ponta e sonhos de paz.
É impressionante observar como os israelenses não se permitem paralisar. Eles transformam perdas em reconstrução, ataques em mais determinação, lágrimas em motivação. Quando a ameaça vem, reagem unidos, e depois retomam a vida, às vezes no mesmo dia, como uma demonstração de que não permitirão que seus espíritos sejam quebrados.
A prontidão que aprendem desde crianças se soma ao espírito solidário que floresce nos piores momentos. E essa combinação constrói um caráter coletivo raro: forte, ágil e ao mesmo tempo generoso.
O resultado é uma sociedade que tem coragem de enfrentar a dor, que não se dobra diante do terror e que, ao mesmo tempo, não perde a humanidade. O caso de Shimomi, que se tornou herói na madrugada mais sombria, ou o enterro de Bruna, acompanhado por milhares que não queriam deixá-la partir sozinha, mostram exatamente o coração do povo israelense: ele bate rápido, mas bate junto, em sintonia com a vida, a liberdade e a dignidade.
A mentalidade israelense é o reflexo de séculos de sobrevivência, de reconstruções sucessivas e de uma esperança que nunca morre. É uma cultura que valoriza a família, os amigos, a comunidade, e que ensina que a prontidão não é apenas para a guerra, mas para a vida como um todo.
Num mundo em que tanta gente se divide por opiniões políticas ou diferenças superficiais, a sociedade israelense prova que a união ainda faz a força, e que proteger uns aos outros é o primeiro passo para proteger a si mesmo.
Que o legado de gente como Shimoni, e a dor transformada em solidariedade vista no funeral de Bruna, sirvam de exemplo para lembrar ao mundo que a coragem, a amizade e a prontidão podem vencer até o terror mais cruel.