Editorial: Alexandre de Moraes e a deterioração das instituições dentro e fora do Brasil

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Alexandre de Moraes tornou-se, nos últimos anos, a figura mais poderosa da República — não por ocupar um cargo executivo, nem por ter sido eleito pelo voto popular, mas por comandar, com firmeza e protagonismo inédito, decisões que ultrapassam os limites tradicionais e legais de um magistrado. No palco político brasileiro, ele atua não como juiz imparcial, mas como verdadeiro estrategista de guerra institucional. E, como todo personagem fora do script, carrega consigo o peso do inusitado: um político de toga, com poderes de Estado e discurso de militante.

A decisão recente de obrigar o ex-presidente Jair Bolsonaro a usar tornozeleira eletrônica, silenciar-se nas redes sociais e manter-se recluso entre 19h e 7h — além da proibição de contatos diplomáticos — não é apenas uma medida cautelar. É uma ilegal demonstração de força na arena das relações exteriores. Mais uma das extrapolações do político de toga.

Moraes, longe de atuar nos bastidores da Justiça, escolheu o centro do palco. Persegue plataformas como X (ex-Twitter) e Rumble, impõe censuras preventivas, bloqueia perfis e determina o que pode ou não circular nas redes. Tudo isso em nome da “defesa da democracia” — mas com métodos que lembram o arbítrio que a própria democracia promete combater. A toga, que deveria simbolizar sobriedade e equilíbrio, veste hoje um ator de discurso beligerante, que se dirige a réus, ao público e até a outros Poderes com postura de general.

Há algum tempo, suas ações têm gerado impactos que ultrapassam as fronteiras do Brasil e ressoam no exterior. As decisões que atingem diretamente empresas e valores americanos provocaram reação dura do ex-presidente Donald Trump, que anunciou tarifas de 50% sobre produtos brasileiros como forma de retaliação. A justificativa? O “abuso de autoridade” do Judiciário brasileiro e a perseguição sistemática a Bolsonaro. Nos bastidores de Washington, há pressão pela aplicação da Lei Magnitsky contra o ministro do STF — algo sem precedentes.

Enquanto isso, o governo Lula, que deveria zelar pela harmonia entre os Poderes e resguardar a imagem internacional do país, escolheu alinhar-se incondicionalmente ao ministro. Em vez de moderação, promove defesa entusiasmada de suas ações, como se Moraes fosse membro de gabinete, e não juiz de uma corte constitucional. A separação entre Judiciário e Executivo, neste ponto, parece dissolvida.

A deterioração institucional é visível. Moraes tornou-se símbolo de uma justiça que se afasta da liturgia e do decoro e entra de cabeça na arena ideológica. Seus adversários o acusam de autoritarismo; seus defensores o tratam como salvador da democracia. Mas o problema de fundo é outro: ele transformou sua função em algo personalista e exótico — um papel inédito e perigosamente expansivo dentro do regime republicano.

A cada medida espetacular contra Bolsonaro, a cada nova escalada contra empresas estrangeiras, o ministro reforça o próprio enredo. Só que nesse roteiro, o final pode não ser o que ele imagina. Afinal, toda concentração desmedida de poder acaba gerando reação — interna ou externa. E o risco é que, ao tentar conter uma ameaça, ele esteja sem querer alimentando outra, ainda mais imprevisível.

O Brasil precisa de instituições fortes, mas não de figuras que se comportem como superministros absolutistas. A força do Judiciário está no equilíbrio, na contenção e na discrição — não no ativismo performático. Alexandre de Moraes, ao contrário, parece confortável na condição de exceção. Um político de toga. Um exótico protagonista em um sistema que deveria ser impessoal.

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